COLUNA

Ubiraci Pataxó

[ELE/DELE]

Aprendeu a respeitar e valorizar todo tipo de vida, e reconhecer que a força está em nossa união.

Cura

Os dias têm sido difíceis, não é?

Não está fácil suportar, não é verdade?

Eu imagino o quanto deve ser difícil para você admitir que a corda que lhe sustenta já está para arrebentar. Deve imaginar diversas vezes que as “pílulas mágicas” já não fazem efeito como antes. Sei também que a “medicina da vez” é a das “plantas de poder”, certo? Então é a vez das medicinas curar o mal que nós mesmos causamos, tapar o buraco que nós mesmo cavamos…

Por gentileza, você quer curar seu corpo, sua mente e/ou sua alma? Se não for um abuso perguntar: VOCÊ QUER SE CURAR DE QUEM? OU DO QUÊ?

Sei que talvez eu já esteja “enchendo o saco” com minhas perguntas, já que “minha ansiedade” está sedenta por respostas. 

Minhas perguntas tem o objetivo de encontrar uma razão para tais emoções. 

O que nos une como “humanos seres” são as emoções e elas são apartidárias de religião, credo, cor, raça, gênero, orientação afetivo-sexual ou classe social… A dor de quem perde um ente querido é igual a todes, em todos os outros cenários no mundo.

Você aí, nunca parou pra pensar ou ao menos questionar as histórias mal contadas a partir da nossa cultura sobre o tal mito ou verdade da nossa criação? 

Perguntar, questionar de maneira leve, sem medo de ser estraçalhado por um raio divino…

Você parou pra pensar porque objetos voadores não identificados (OVNI ou UAP) conseguem cortar os céus numa velocidade surpreendente, se movimentando de um lado para o outro em fração de segundos e que nossa mais avançada das avançadas tecnologias não chega nem perto de fazer isso?

Será mesmo que diante de tantos planetas e corpos celestiais somos os únicos seres neste universo? Somos o único planeta habitável ou habitado?

E QUAL A RELAÇÃO DISSO TUDO COM “A CURA”, MEU AMIGUE?

Para nós indígenas, cada pergunta tem um mundo de respostas e é por meio dos questionamentos que as crianças experimentam este mundo. São elas que nos ensinam a encontrar respostas para questionamentos bobos e, às vezes, desconcertantes para os adultos, porém, complexos para uma criança. 

Por acaso você já se esqueceu da sua criancice? Por que o céu é azul? O peixe dorme? Onde fica escondida as asas das borboletas quando ainda são lagartas? Como a água entra no coco? De onde vem as águas que brotam das nascentes? Porque as nuvens parecem paradas se tem vento soprando? A cor do mar é azul ou verde? E por que tem essa cor?

As crianças descobrem nesse momento que os adultos não sabem de tudo e que a explicação de que “Deus quis assim” não é suficiente. A partir de então torna-se investigadora, questionadora de coisas divinas e tudo é fascinante… 

A criança que já não brilha os olhos nesse mundo, certamente já lhe foi apresentada a incoerência do mundo adulto.

Agora, voltando à questão… Você, adulto que leu até aqui esse texto, pergunte à sua criança de onde vem a sua dor… Do que precisa se curar? Se for da sua mente,  o que é ou quem tem tirado a sua paz? Se for a sua alma, o que foi que aconteceu na tua história que é como um “crime hediondo”, que te magoou ou ainda te magoa até os dias atuais? Qual foi ou qual é a batalha que seu corpo cansado, exausto já não quer mais lutar e está reclamando descanso?

A inteligência artificial vai substituir muitas coisas que criamos para satisfazer nossos desejos, porém, jamais terá condições de encontrar respostas para cura dos sentimentos… Essa tecnologia é somente nossa, seres micro e macro biológicos.

Se as crianças “crescidas” não pararem de criar falsas ilusões com a finalidade de ocupar nossas mentes,  talvez ainda terão como perguntar aos mais velhos… Tá com dúvida, pergunte a Mamãe Terra, pergunte ao Pai Sol, questione a Vovó Lua ou Vovô Espírito Guardião do Tempo…

Bateu curiosidade, é só perguntar, linda criança…

COLUNISTA

Ubiraci Pataxó_site

Ubiraci Pataxó

[ELE/DELE]

Ubiraci Silva Matos pertence ao povo Pataxó da aldeia de Coroa Vermelha, em Santa Cruz Cabrália, na Bahia – maior aldeia urbana da América Latina, muito famosa por ter sido palco da invasão portuguesa neste solo chamado Pindorama, conhecido como Brasil. Quando apresenta-se como Ubiraci Pataxó, sabe que está falando por toda uma comunidade, por todo um povo, por toda uma cultura. Ele é um jovem mestre do saber e aprendiz de pajé, graduado em Ciência da Natureza e Matemática, no curso de Licenciatura Intercultural Indígena, pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Bahia. Também formado em Terapia Comunitária Integrativa (TCI), Massoterapia e Técnica em Resgate da Autoestima pela Universidade Federal do Ceará (UFC), em parceria com o Movimento Integrado de Saúde Comunitária Quatro Varas (MISMEC – Projeto 4 Varas). Atua como pesquisador nos projetos “Saúde Coletiva e Epistemologias do Sul e Interculturalidades”, na Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB) em parceria com Universidade de Coimbra, em Portugal e formador em Terapia Comunitária Sistêmica Integrativa no Polo de Cuidados Korihé em Santa Cruz Cabrália/BA e na Europa pela Réseau Européen de Thérapie Communautaire Intégrative. Também é membro do Comitê de Saúde Mental do Consórcio Acadêmico Brasileiro de Saúde Integral (CABSI), do grupo de pesquisa “Teia das 5 Curas – Todos Nós Somos Parentes”, que envolve povos indígenas no Brasil, Peru, México e Canadá, com enfoque nas cinco curas (pensamentos, sentimentos, relações, ciclos ecológicos e trocas econômicas), da Associação Brasileira de Psiquiatria Social (APSBRA) e membro da Associação Brasileira de Terapia Comunitária Integrativa Sistêmica (ABRATECOM). Em toda a sua história, ele aprendeu a respeitar e valorizar todo tipo de vida, e a reconhecer que a força do nosso povo está em nossa união e de que “um” não pode ser mais forte de que todos nós juntes.
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